<em>Qué las hay, las hay</em>

Margarida Folque
Este ano a Câmara Municipal de Lisboa decidiu associar-se à Festa do Avante!. Só assim se entende que tivesse escolhido o sábado e domingo em que a Festa se realiza para oferecer aos seus munícipes dois concertos grátis, com a participação artística de Carlos do Carmo, Camané e Da Weasel, acompanhados pela Sinfonietta de Lisboa.
Foi um gesto simpático, sem dúvida. O problema é que há sempre os que, malevolamente, vêem logo no mais ingénuo e simples gesto um sinal de uma qualquer conspiração. São os desconfiados. São os que se interrogam sobre tudo. São os que gostam de chamar queijo àquilo que se está mesmo a ver que é fromage.
Esses, questionam a data escolhida por Carmona Rodrigues, que até já teve oportunidade de viver in loco a Festa do Avante! e sabe que não há concerto que desmobilize quem lá costuma ir. Questionam a escolha – mais que acertada, é verdade – de dois artistas e de uma banda que mais de uma vez actuaram para o público da nossa Festa, assim como de uma orquestra que, por acaso, também lá vai este ano. Questionam até – imagine-se! – a generosidade do gesto (vendo nele uma achega à famigerada Lei de Financiamento dos Partidos, que unanimemente se reconhece ter como objectivo único «lixar» o PCP e a sua Festa).
Ora como pode alguém ter tais pensamentos? Há gente muito desconfiada!
Os comunistas, então, nem se fala! O Governo encerra Escolas, Centros de Saúde, Urgências, Maternidades e outros serviços públicos, particularmente no interior, tudo para rentabilizar serviços e poupar dinheiro ao País, no fundo a pensar no bem-estar dos portugueses? Pois logo aparecem os comunistas a reclamar a abertura dos serviços encerrados, alegando bré-bé-béu, bré-bé-béu... que nestas zonas vivem pessoas idosas e carenciadas, que são zonas já muito desertificadas, que o objectivo do Governo é a mais ou menos curto prazo privatizar estes serviços! Imagine-se!
A Opel encerra a sua fábrica na Azambuja, colocando no desemprego milhares de trabalhadores, depois de ter recebido todas as benesses do Estado português, porque os pobres patrões, coitados, estão aqui a ganhar menos uns euros por carro do que em Salamanca, onde obviamente puseram tecnologias de ponta que aqui não colocaram? Pronto, lá estão os comunistas a acusar o Governo de permissividade para com as multinacionais – que depois de comerem a carne aos trabalhadores portugueses deitam os ossos aos cães – e a exigir que a empresa pague tudo aquilo a que os trabalhadores têm direito.
Israel invade o Líbano, destrói tudo quanto é casa, pontes e estradas, mata milhares de pessoas porque pretende reaver, como é natural, dois soldados capturados na fronteira com o Líbano, por onde se passeavam, e acha insuficiente, também como é natural, a quantidade de terra roubada a outros povos para a constituição da sua pátria? Pois lá estão, outra vez, os comunistas a juntar a sua voz ao coro de indignação que percorre o mundo, a acusar a ONU e as altas instâncias europeias de não tomarem medidas atempadas para pôr cobro ao massacre, a criticar o Governo português por ter permitido que aviões israelitas usassem a base das Lajes nesta guerra. Não tivessem os comunistas sido vítimas também do holocausto, não tivessem tantos, tantos deles morrido por então ousar defender os judeus e combater o nazismo, até se pensaria que são anti-semitas!
Não tenhamos dúvidas! É mesmo vontade de pegar! De ver fantasmas em todo o lado!
Ou não? Ou será que a tão ridicularizada «teoria da conspiração» é mais um estigma em moda para calar a voz de quem procura ver um pouco mais longe do que aquilo que os seus olhos alcançam ou que diariamente lhe impingem?
Enfim, tudo a propósito daquele evento que a Câmara de Lisboa decidiu promover nos dias da Festa do Avante!. Cá para mim, esta foi a forma – talvez desajeitada, é certo – que a Câmara encontrou de reconhecer publicamente a Festa dos comunistas – a Festa do Avante! – como o evento político e cultural mais importante do País e o PCP como o único partido português capaz de a realizar. Cá por mim, não acredito em bruxas. Pero que las hay...


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